quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O ATRAVESSADOR E A PONTE



Há dois tipos de pessoas: as pontes e os atravessadores. Pessoas pontes são aquelas construídas por forças maiores, com a finalidade de ligar um mundo ao outro. São feitas de concreto, não possuem sentimentos, afinal, são pontes. Permanecem lá durante anos, sofrendo as ações do tempo, da natureza, recebendo rachaduras, sendo pisadas, sujas; eternamente sob os pés daqueles que passam. São de muita serventia, afinal, necessitam das mesmas para unir mundos que, a priori, estavam separados por centenas – até mesmo milhares – de motivos questionáveis, mas ainda separatistas. Mundos que foram determinados, classificados como diferentes e colocados em pontos opostos, através das pontes, passaram a se comunicar.
Entretanto, há os atravessadores. Eles apenas levam as pessoas de um mundo a outro, seguram em suas mãos, entrelaçam seus dedos e ajudam a travessia, incentivando-as, motivando-as, destilando suas ideologias durante o percurso. Possuem contato íntimo com aqueles que precisam atravessar, e aproveitam o momento para demudar as mentes daqueles que buscam união de mundos. Os atravessadores e aqueles que precisam atravessar não irão se lembrar das pontes que ali ficaram sob seus pés, anos após anos, fazendo seu trabalho em silêncio. Lembrarão, pois sim, daqueles que seguraram suas mãos, que lhe deram um ombro, brandiram o guarda-chuva, evitaram os choros. Mas elas continuarão lá, sem questionar, sem deixar de sorrir, sem ter suas partes danificadas pelas ervas daninhas a ganhar espaço em seu corpo em constante envelhecimento, mesmo sendo feitas de concretos. É claro, com certeza, que irão se lembrar dos atravessadores, também com sentimentos, mas escondidos em torres de marfim ou concreto, que sabem separar a bondade da verdade, do futuro, do seu trabalho; pessoas que não se dão por inteira, porque se guardam, se protegem, sabem dos perigos do mundo, do outro, do além, ao contrário das pontes que se abrem por inteira, esticam seus braços e dizem: - “Podem passar, eu estarei aqui sempre. Não vou fechar meus braços para você.” E você passará por ela, pisará na mesma e não irá se importar nem em saber quem ela é. Todavia, não pisará nos atravessadores, pois estará segurando as mãos dos mesmos, olhará nos olhos deles, sentirá os batimentos daqueles corações, o calor daquelas peles. Os atravessadores são de suma importância para assassinar seu particular medo de misturar mundos, experimentar outros corações, bebericar de diversas almas; eles existem para arrebatar o medo de viver. São eles que ao tempo da travessia plantarão sementes em sua cabeça, fazendo sua alma cultivá-las, assim, após o término da travessia, você jamais esquecerá quem o ajudou a passar: aquele que lhe atravessava sobre uma ponte calada.
 Desculpem-me, mas eu sou um atravessador.

- Faah Bastos

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

ESSA TRAGÉDIA

Quisera um dia tu possas notar o erro que cometeu por mim não lutar.
Quero que mordas tuas palavras e se envenene ao pronunciar…
Que na verdade estou enganado já que juras me amar.
Quisera Deus um dia Ele te mostre como se deve amar,
Pois essa migalha que tu enaltece e colocas em meu altar…
É apenas uma fracassada comédia do que és amar.


- Faah Bastos

CÔNCOVA



Eu fecho meus olhos, desligo meu corpo, e permito que minha mente vague por entre caminhos sinuosos da minha existência, assumindo sua posição de senhora das minhas verdades, toma para si o poder territorial de cada centímetro epitelial do meu ser. Um lugar que desconheço por inteiro, que odeio por permanecer inserido em mim, escondido entre meus olhares vazios ou cheios de dor. Um lugar adormecido entre as catedrais do meu pensamento, das portas trancadas que escondem em sua essência as respostas das minhas internas confusões entre o que sou e quem deveria ser. Vago sozinho por entre os campos umedecidos com o orvalho da incerteza, da derradeira dor dos raios de sol que tentam evaporar as lágrimas de sofrimento deixadas pela senhora noite em horas atrás. Caminho assim, nessa solidão de muitos, esquecidos por todos, mapeado por corações descrentes da sua própria capacidade. Uma jornada assim tão solitária, enrubescida em suas maçãs do rosto, manipuladas pela saudade quase que assumida. São trajetos misteriosos que definem o rumo da minha alma, o ponto final dos meus batimentos fracos, porém ritmados, como numa canção de ninar profunda, lânguida pela saudade dos carnavais jamais cortejados por minha banda de amor; uma marchinha fúnebre dos momentos que na terra foram fincados, a ponto de quase enterrá-los em túmulos malfeitos.  
São trovoadas de amor não resolvidas, arraigadas na minerva sensação de desprendimento; alforria de tolo sonhador que ainda acredita em recomeços sem dor, sem perdas, sem dilaceração do passado. Podre aquele que vaga por entre os arbustos da vida procurando flores entre a sombria côncava das mãos injustiçadas. Então respiro mais, transformo-me em flor e planto-me em teu futuro jardim, meu amor. Afogo minhas vertigens niqueladas, ultrapassadas, massacradas e vencidas pelos senhores das estações; assumem papéis de generais do medo, com suas armas pesadas e carregadas de ofensas que por tanto tempo nadaram por entre os oceanos dos meus olhos; são infortúnios de uma alma escritora da sua história inacabada. Volto a abrir meus olhos e encarar o fogo dos raios de sol de verdades não mais adormecidas.  

- Faah Bastos

ESSA MINHA PÁTRIA DE MULHER



Ela é sagrada, assim como uma santa em teu altar de rosas. Tão intocável, com ar de divina, traz paz e agonia para esse meu peito patriota e de amor religioso. Ela se transforma, deixa de ser santa para ser minha pátria, território de homem corajoso, que não teve medo do amor buscar. É por isso, meu amor, que sempre exilo-me em ti, entre tuas faixas territoriais, hasteando minha bandeira em teu corpo, passando meus dedos entre essa tua nação fogosa. Travaria, de certo, guerras e guerras, para todas as noites festejar as nossas conquistas, destruir os inimigos e dominar mais outros castelos. Horas sim, horas não, vou alimentando certo medo, confesso, de ter sido possuído por aqueles espíritos malignos que queimam cartas ultrapassadas de amores doentios.
Minha dama tem sal, água e terra em teu corpo. Já destruiu os cálices de vinho da minha alma, transformou tudo em baile, hoje, não mais rega as rosas com as lágrimas desse tosco poeta. Tenho vontade de arrancá-la do altar, niná-la, enchê-la de beijos mimosos, usá-la de tal grado, que se apaixonará por mim a cada amanhecer duma nova estação. Retirar essa manta que cobre teu corpo, essas sapatilhas desnecessárias, te deixar tão pobrezinha de tudo, mas rica de mim – de mim em ti, assim digo. Ah, mas eu te amo tanto, santa minha, que não tenho mais religião se não for cativo a você. Sou filho do vento, ando em contato com a dor do tempo, do firmamento, dessa invasão dos cosmos, perdido em suposições, indecisões e controvérsias, tudo assim, meio que incompleto, à espera do livramento da minha alma que recusa o regresso à racionalidade e me prefere assim, tão animal. Destarte, ainda tenho-te como uma flor sem espinhos, um ar correndo em meus pulmões, um contentamento poético, uma fé sem dogmas, mas perdida nessa imagem da minha Santa Apenas Minha Senhora; com juras infinitas de amor guardado, promessas de chuva de caju ao fim da tarde se fundindo com teu cheiro de menina bonita, toda, assim, mimosa.
Larguei tudo no passado que não mais me anima, minha Santa. Mulheres, poesia torta, conhaque pela metade, fumaça de cigarro, rabisco de contos, camisa mal passada… Sem fontes, sem histórias, exatamente assim, sem laço com nada, preso apenas a ti, doce mulher da minha sagrada aurora. Desse jeito, papel branco, pronto para ser usado, assim espero, por ti, com essas mãos de menina delicada, dessas que não precisa nada fingir, nasceu um pãozinho doce, na medida certa, com os olhinhos de bebê. E, assim espero, que ela faça bom proveito.
Essa minha mulher tem mania em ser minha pátria, não se contentando em ser minha Sagrada e Divina Senhora.

- Faah Bastos


Sou feita das gotas da chuva. Refaço-me e desmonto-me em silêncio, sem puxar de porta, sem arranhões na parede, tudo muito sutil e delicado. Morro e ressuscito a cada respirar, toda vez que seus lábios tocam delicadamente a relva dos meus olhos, assim como as ondas ultramarinas de amar banham meus cortejos líricos de corações enfeitados com margaridas e cordel. Não tenho asas nos pés, nem pretendo ter, sou exatamente assim: um fim de um começo sem fim, uma trajetória desfeita e transformada em rastro de nuvem sobre a calha seca, cheia de folhas mortas, ainda esperando os ventos do sul. Não me alimento de frutas, sou que nem o tempo, neutro, mas cheio de horas, contas, segundos, medidas, limitações, não escrevo poesia em minhas madeixas, suspiro incontáveis estrelas dentro do meu frasquinho de segredos. Sou gaivota de dia, travesseiro à noite. Invento jornadas sem fim por mundos imaginários, nem sou rainha ou princesa, optei mesmo por ser plebeia, correr livre pelos jardins secretos das almas adormecidas no candelabro da saudade, bebericando doses suaves do meu preferido vinho do porto: teu sangue.
Mudei de lugar, estação ou universo, apenas para andar um pouco mais, usar guarda-chuva quando deveria caminhar nua pela rua, pela praia, enfiando os pés na areia morna. Sou solstício de verão inesperado, improvável, mendigando gotículas de suor para banhar de sal as minhas lágrimas – doces lágrimas –. Evito chorar cantigas, recitar poemas milenares, prefiro me prender em gruta, lançar-me aos moinhos de vento em meus canaviais de corações destroçados. Deveria existir uma fábrica de conserto, um albergue de palavras, algum expoente em meu sol de saudade, alguma colina de águas saudosas. Quando criança, sapeca menina, corria por entre os lírios dos teus olhos, você nem sabia. E no mármore dos nossos beijos, confessei meu apego pelo senhor, o protetor das minhas vergonhas, criador dos meus melhores sonetos. Hoje nego favores dispensados, gracejos de bom moço, pois entreguei meus melhores passos apenas a ti, meu doce e eterno moço.

- Faah Bastos

ASSIM COMO TU: CHOREI.

Vivi, amei, dilacerei, tal como tu: ressuscitei;
Que de repulsa afastei-me da terra, como um
Verme fugindo das entranhas do mistério.
Tentei tornar-me borboleta, mas prossigo
Encasulada.

Beijei, sofri, chorei, tal como tu: morri.
E num devaneio sem sentido, refiz-me
De palavras cheias de esperanças
Ainda trancadas em seu diário macabro.

Suspirei, solucei, reconstruí, tal como tu: perdi;
As propensas soluções da alma se envelheceram
Em uma gaveta qualquer, entre as fotografias
De corações apaixonados destinados a sofrer
Por caravelas que partem, por procissões de alma,
Cortejos de flores embalsamadas com o amor pungente.

Amordacei, desatei, suscitei, tal como tu: despedacei;
Como um botão de flor que não mais se alimenta do mundo,
Deixando as pétalas formarem tapetes perfumados,
Escondendo a lama dos meus olhos.

Tal como tu: chorei.

- Faah Bastos
São limitações que fazem raízes em meu peito, como um acorde louco de uma cantiga desfeita em retalhos de pano de um cancioneiro bêbado. São apenas lamentos de um lobo feroz que arrancou o coração com as garras da sanidade, deixando sobre a terra seca as últimas gotas do seu calvário. Prelúdios de uma inconfidência psíquica que andava cavalgando adormecida, sem cabeça, por entre os arbustos secos da memória suja, pérfida como um primo que não sobreveio ao trono do seu rei, desumanamente assassinado. E nessa fagulha absurda de tratados de dor, ergo minha taça vazia de vinho, manchada com meu próprio sangue, diante dos barões dos vendavais da alma, e sorrio tristonho, mas ainda embriagado pelo cinismo da minha natural corte. Quero, que por favor, me perdoem os métricos, os falsários de amor, os incontidos, os realistas e até mesmo as benditas damas que sonham com príncipes (nem tão) encantados; mas sou promíscuo demais para permanecer nesse baile de iguais, sentar-me à direita de um rei mascarado, nessa divina comédia previsível de horrores maquiados por amor rimado.
Prefiro, pois sim, ser um louco, um largado, uma besta fera das vertigens, ainda sedenta por palavras que ultrapassem o papel, que rasguem minha alma, que ceguem meus olhos e façam morada eterna em minha pele. Não apenas palavras sussurradas com uma determinada sacanagem gostosa que me faz gemer como um louco em pleno gozo, mas sim como um boêmio suado e ansioso por mais e mais bordel de amor. Essas dosagens de paixões não cabem em meu bolso imenso, quase que rasgado. Prefiro toda a devassidade das saias justas das donzelas maldosas, que guardam no peito um coração desesperado por romantismo, não apenas desse que encontramos em uma esquina qualquer, ou em um baile de máscaras, todos escondidos por imagens macabras, muito menos nos livros de Shakespeare. Prefiro, pois bem, ser o Casanova de cada vagina que queima, vibrando com a imagem da minha língua poética a deslizar por seus ultrajantes caminhos (pois, sou um devasso incompreendido). Esse arranha-céu de mordomia me enoja, tenho cá minhas repulsas, por isso eu uivo ao céu, em busca de uma dama que largue toda a métrica e valse nua comigo pelos jardins da sua própria casa.
Não apedrejem a minha face devido a minha honestidade absurda. Sou daqueles apaixonados que prefere sugar (hum…) tudo de bom que há no amor, no ódio, na paixão doentia que rasga roupa, que penetra, que faz filho, entre outras promiscuidades que me torna o próprio inferno. Não menosprezo essas manifestações distorcidas da bíblia romântica, não sou nenhum religioso, e nem devoto da fidelidade a um sentimento que fora reduzido a uma palavra tão simples, tão modesta: amor. Eu bem que queria, pois sim, ser considerado um revolucionário dos assuntos do coração, mas alguma maldita criatura, deliciosamente pecaminosa, roubou de mim as mais perfeitas rimas, deixando-me perdido entre a escuridão de uma solidão salgada e uma partida sem fim. Eu não existo em um ponto, não sou vento, nem mesmo o tempo, apenas fui sintetizado em folha seca ao mundo, que voa pelos mistérios dos sorrisos que escondem verdades, bebericando de fontes secas, gracejando faces que deveriam desenhar prantos de saudade. Eu sou a adaga afiada que ainda não feriu nenhuma alma, excetuando, de certo, a minha própria existência.
Mais um gole, por favor.

- Faah Bastos

sábado, 19 de novembro de 2011

VOSMICÊ QUER CASAR?

Desde que ocê entrou na minha vida, viver é um trabalho danado de complicado por demais, vice? Os dias correm dessa forma preguiçosa e me bate uma vontade toda das grandes que num sei explicar de correr até sua casa, jogar uma pedrinha em tua janela e chamar teu nome cantando, assim, que nem curió. Fico olhando o céu, quando dá, né? Só pra ter certeza que tu num deixou uma faisquinha por lá na tua passagem, tenho cá comigo que tu só pode ser lá de cima, isso bem que dá medo; medo dos grandes, de perder ocê quando o cabra lá lembrar que teu lugar nem é aqui, mas bem que poderia se aproxegar um cadim demais aqui em peito, né, morena? Desse jeito assim toda dengosa, passando pela porta do meu trabalho num tem santo que aguente, num é mesmo? Homem assim que nem eu, fica bambo das pernas só em pensar numa formosura dessa, que é você, dando piscadinha pra mim, assim, sem safadeza niuma, né?
Ah, neném, se tu soubesse, assim, mó de quê tenho apreço pela Vossa Alteza, bem que seria menos fechada que nem baú de velho, num é não? Passaria pro mó de aqui mais vezes, soltando gracejos pra esse seu moço todo abobalhado, que só farta babar nas ventas de tanto amor que tem por ti. Vivo cá dizendo pro meus cumpades que ocê é a dona moça mais linda que tem por essas bandas, num tem santa mais linda que ocê, minha cheirosa. Toda bela, toda minha nesses sonhos por aí na noite, tu toda embonitada, com vestidinho de xica, mostrando sascoxas grossas de menina que corre pelos campos, sobe em pé de jambo e brinca de pega-pega. Tu bem que poderia ser uma chuva de caju que nem aquelas de cinema, quando o mocinho vai dizer que ama, mó bucadim antes do beijo, vice? Se eu pudesse? Arra, se eu pudesse te chamava de minha, cheia de orgulho, seria até engenheiro, aquele da lua, ou até das estrelas, pra fazer mais brilho nesse teu céu anil, nesses teus lábios – amor.
Mas pra casar contigo, só mesmo sendo dotor, desse com pedaço de papel, diproma, como disse teu pai quando me escarrerou da porta da casa de vosmicê, eu todo aprumado, tinha até passado perfume, só pra ver meu botão de rosa se debruçar na janela e ver o cruzeiro do sul. Vossa Excelência, bem que poderia amolecer o coração de touro do teu pai, quem sabe guardar aquela arma dele. Coroné anda nervoso com medo que eu roube ocê dele, mas se ele soubesse que tu já anda aqui dentro desse peito que te chama todos os dias, que bate assim que nem trem saindo da estação, ele nem se ousaria a me pedir um papel. Já se viu amor assim? Daqueles que se assina? Mar pois, minha menininha, deixe eu dizer, to cá querendo por demais casar contigo, ter mais de oito filhos, fazer amor contigo na rede sob o as estrelas alumiando nosso amor, anunciando a chegada das flores, que nem época de chuva. Colocar tua mãozinha de princesa, vixe, nem, de Rainha, em meu peito e tu sentir meu coração fazendo tum-tum-tum-tum-tumt-tum, porque, afinal, toda vez que tu sai de perto deu, meu coração fica no tum... tum...
Ei, morena, larga tudo e foge comigo. 

- Faah Bastos

Eu nasci para a poesia, sem pretensão em ser nada além do que uma andorinha solidão. Tenho paixões diversas, dessas que nos alimenta por um curto ou longo tempo, mas todas com prazo de validade, exceto essa relação de carne e alma que tenho com a poesia. Embriago-me, recrio-me e desfaço-me em sonetos, versos, lírica, com ou sem métrica, mas derradeiramente verdadeira. Tenho relações complexas com meus livros, as personagens que crio, e deixo pelo mundo exalando literatura, loucura poética, monólogos que não possuem fim. Sou dessas mulheres que ainda se sentem meninas, outras maduras demais para o mundo; falando nele, tenho quase certeza que não caibo mais em suas faixas territoriais. Cresci demais, meu Deus, e agora não tem espaço para mim e minhas quedas para o alto, meus choros poéticos, minhas canções de dormir compostas em uma relva qualquer, ou até uma poesia solta dentro de um conto...
Eu criei asas, meu Bom Senhor, porque os pés que recebi ao nascer, limitavam-me a ficar na Terra, presa entre iguais, sufocada pelo ar compartilhado. Por isso tenho voado tanto, cortado nuvens, feito das estrelas uma companhia, porque simplesmente tomei emancipação da humanidade e me tornei galáxia de mim.

- Faah Bastos
Resolvi me desfazer para o mundo. Fechei as portas da minha casa e optei em ficar aqui calado, perdido em meu silêncio verdadeiro. Viver usando máscaras de caráter tem tirado minha paciência, não quero mais ver rostos cobertos por sorrisos ensaiados e lágrimas forçadas. Prefiro ser casulo, ser distância, ser vento.

- Faah Bastos

ORAÇÃO DA BOA ALMA

As lágrimas que em minha face hoje escorrem, juro, se tornarão gotas de força para inundar minha vida de felicidade. Não haverá rocha que não se transformará em poeira, diante da minha garra em vencer, em ser o melhor em mim, por mim, além. Não medirei esforços e nem vou recuar diante das dores, eu serei mestre do meu próprio destino, curandeiro das minhas chagas, feridas, muitas vezes, abandonadas. Não haverá lâmina capaz de cortar meu rosto sem antes sentir o peso das minhas palavras. Meu olhar será o único farol existente a iluminar meu caminho tortuoso. Não precisarei de misericórdia, reinventarei minha própria história. Farei uma armadura de ferro e hei de proteger meu coração, mesmo se um dia, ferido for, assumirei o leme da minha jornada e o lançarei ao mar, sem pena, sem pudor, sem remorso, mas ainda será minha melhor opção.
Não vou calar a minha voz perante os gigantes do destino, nem mesmo contra os reis frios e obscuros, vou vencer batalha por batalha com apenas um único escudo e minha palavra-espada. Serei o vencedor desse jogo de azar, dormirei entre as nuvens e saciarei minha sede no orvalho da continuidade. Não deixarei espaços para o acaso, nem mesmo para as incertezas. Serei Lampião do meu sertão coração, que ainda implora por chuva de saudade. A partir de hoje, eu serei o sol da minha renascença.

- Faah Bastos

AMOR POVILÉU

Meu amor tem gosto de poviléu,
Cuspindo carícias como um fidalgo desalmado,
Refugiando-se em parelha de passado –
Histórias de dores não vencidas.
Tem aquele ar de soldado da corte,
Hasteando bandeira feita de pele,
Suja de sangue; guarnição de amores,
Talvez recolhidos, muitas vezes sonhados.
- O que sucede? – pergunto-lhe.
- Tristeza da solidão outorgada no papel;
Papiro de gente, escrito com lágrima,
Choro de criança condizente.
- Mas desgraça! Maldito seja aquele quase defunto!
- O amor?
- Não, a saudade, que concerne meus segredos adormecidos,
Banhando-os de luz, varrendo para longe, aprisionando
No bálsamo dos medos, na raiz dos meus anseios,
A proliferação do meu reino de lamúrias encorpadas,
Recheadas de borboletas selvagens que regressam
Ao casulo do tempo.
Um maldito vigário do amor reprimido
Que morreu aos cantos clamando a fecunda
Alma do desejo esquecido.

- Faah Bastos

CARA SENHORITA,



Quero informar que seu comportamento não é nada cortês diante meus singelos galanteios silenciosos, deveras, mudos, surdos, e até mancos. Por sorte, sou um homem bem resolvido quando se trata do amor, então, não levarei em consideração as tuas batidas de portas diante as flores mais formosas que colhi nos jardins desconhecidos. Confesso, pois sim, que desconfio da ausência de educação por parte da tua genitora, que olvidou de cuidar dos teus dotes comportamentais, permitindo que a selvageria típica da mocidade dominasse o território dos teus lábios e olhares. Não é certo moçoila assim, tão aplumadinha, andar pelas ruas mostrando sorrisos para todos os poetas mendigos. Anda ferindo minha alma com tuas graças de criança para o vento, esse perturbador de pele, indivíduo mais ousado que fica a roçar em tua epiderme pálida, imaginariamente macia, demasiadamente cheirosa. Ah teu cheiro deve possuir o acre da loucura com a embriaguez da necessidade – droga viciante essa que tu vendes por aí; paixão em frasquinho de vidro. Já se viu coisa parecida?
Sou um homem bem feito, nariz empinado, olhar forte, lábios delineados, ar de fidalgo, mesmo que rico apenas de amor, pobre de riqueza terrena, todavia, não venha a ser uma barreira, imposição ao sentimento latente em minha alma de sonhador. Pago teu dote, se assim me obrigarem, roubo-te com ou sem consentimento dos teus pais, afinal, dá asas aos filhos para criarem ninhos, de preferência em meu coração. Prometo-lhe moradia em mim, amor em nós, alimento da vida, caminhada contra a morte. Faço uma listinha no verso dessa carta que era para ser um bilhetinho, contando cada qualidade desse teu aqui, quase, namoradinho. Faço serenata, monto em touro, laço nuvem, roubo estrela, recito poesia, refaço-me em segredos, desmonto-me por inteiro, permito-lhe ser minha rainha, modelar-me à sua necessidade, me recriar sozinha.
Contudo, tenho dito, minha doce senhorita de nariz engomadinho, não ouse dizer-me não, pois de tristeza não se vive, morre aos pouquinhos, como passarinho que não pode voar, cortar o céu em segundos, navegar pelos horizontes. De Ícaro, nem fuça tenho, quanto mais asas. Então, senhorita teimosa, tenha pena desse proletário coração que aqui implora: largue toda essa pompa e venha casar comigo entre os jardins, na alvorada dos nossos sonhos, reinventado o amor desmedido que espera a nossa necessária valsa.

- Faah Bastos